Os Cavaleiros do Zodíaco: A Saga dos Titãs:
Capítulo 5
O voo do dragão adormecido
- Levante-se!
- Eu não consigo, pai... - Admitiu Ryuho caído no chão, com uma voz falha e ofegante.
Ryuho continuou com a atenção voltada para o pai. Aquilo não era nenhuma novidade para ele, sabia o quanto Shiryu era poderoso, e já havia presenciado a demonstração de tal poder umas duas mil vezes em toda a sua vida.
O Mestre do Santuário prosseguiu enquanto permanecia elevando o seu cosmo.
- A origem do poder cósmico é um pequeno universo que existe no interior dos seres vivos, apesar de apenas parte deles poder sentir este universo. Quando o cosmo do indivíduo é elevado, este universo se expande, criando um fenômeno conhecido como "aura." A aura é a manifestação visual da queima do cosmo, que é o estágio intermediário da elevação do mesmo. Durante a queima do cosmo, o universo interior do indivíduo arde, e a aura se expande conforme a temperatura aumenta, se o cosmo for elevado o suficiente, ele explodirá. A explosão do cosmo gera um pequeno Big Bang no interior do indivíduo, expandindo sua aura ao volume máximo e permitindo que ele acesse a essência do cosmo, o sétimo sentido.
Naquele momento Shunrei chegou ao local do treinamento, mas sabia que deveria se manter afastada.
- Apenas acordando o cosmo, uma pessoa pode ganhar habilidades diversas, como telepatia ou intuição. Elevando o cosmo se é possível atingir velocidades subsônicas, quando o indivíduo o queima, pode atingir velocidades ultra-sônicas ou Mach de 100 golpes por segundo. A explosão do cosmo aumenta a velocidade dos golpes para absurdos Mach 800+, atingindo a velocidade da luz em Mach 880.97 você será capaz de alcançar bilhões de golpes por segundo...
- Isso é loucura, pai! - Gritou Ryuho interrompendo Shiryu.
Shunrei arregalou os olhos e estremeceu, ela nunca tinha visto o filho daquela maneira.
- Como é que uma criança de treze anos será capaz de despertar um poder que visa explodi-lo por dentro. - apontou para a cachoeira e prosseguiu. - Além disso, é impossível reverter o fluxo dessas águas.
- Já falei dezenas de vezes que não é! - Bradou Shiryu. E novamente Shunrei estremeceu. - Eu consegui quando ainda era uma criança. Você é meu filho, e tudo que aprendi com meu venerável mestre eu lhe passei. Você é forte e conseguirá, basta querer!
- E se eu não quiser! - Gritou Ryuho como se suas últimas forças estivessem expressas naquelas palavras. - Será que o senhor não entende. Eu não quero ser cavaleiro. Eu quero viver aqui, com a minha mãe e você, pai! Entenda isso, por favor. Eu não pedi para treinar e quem foi que disse que eu devo ser um guerreiro como o senhor foi?
Shunrei colocou as mãos sobre os lábios horrorizada, mas seus olhos não conseguiram esconder todo o espanto que sentia.
As palavras de Ryuho penetraram como uma flecha maligna no peito do Mestre do Santuário. Ele nunca pensou em ouvir aquilo de seu filho. Na verdade, Shiryu recusava-se em acreditar que estava escutando aquilo. Viajara quilômetros para passar os últimos ensinamentos para o filho, e finalmente lhe entregar a sua armadura de dragão, para que Ryuho lutasse ao seu lado pela paz na terra e pela segurança de Atena. Mas todo aquele sonho e desejo havia sido levado pelas águas da cachoeira que desciam claras e silenciosa nos Cinco Picos Antigos.
- Está bem. - Disse Shiryu diminuindo a intensidade do seu cosmo, até que a luz se extinguiu. - Não há mais nada o que dizer e nem lhe ensinar. Vou respeitar sua decisão, Ryuho. Seu treinamento acabou.
Shiryu levantou-se e sem dar mais nenhuma palavra seguiu à passos longos para casa.
- Espere, querido. - Disse Shunrei com sua eterna e serena voz. - O que aconteceu? Diga-me.
O Mestre do Santuário apanhou as mãos da esposa nas suas, acariciou e depois se afastou sem dar qualquer tipo de explicação. Shunrei olhou na direção de Ryuho que tinha os olhos direcionados para o nada, numa direção contrária. Ela percebeu que ele chorava. Talvez estivesse arrependido das palavras que tinha dito ao pai ou esperava um pedido de desculpas dele.
Shunrei pensou em dezenas de coisas que poderia dizer para acalmar os dois. Ele sabia que a vida de uma cavaleiro não era fácil, pois convivera com isso durante toda a sua vida esperando Shiryu durante as noites e dias, ou até mesmo rezando por ele enquanto lutava. Ela também pensou na possibilidade de Ryuho mudar de ideia. O filho estava se sentindo pressionado desde que o pai chegou e não sabia como agir. Sua missão era despertar o cosmo e se tornar um cavaleiro, mas ninguém nunca o perguntou se era isso que ele queria.
O tempo passou, e Shunrei permaneceu em silêncio. Voltou para casa ao lado do filho, mas não disse nada sobre o assunto. Na verdade ela não puxou nenhum tipo de conversa com ele.
Quando chegaram em casa, viram Shiryu sentado numa mesa bebendo um chá. A fumaça branca da bebida esvoaçava da caneca. Ela sorriu ao ver o marido, mas ele desviou o olhar sem expressar qualquer afeto ou demonstração de carinho. Ryuho abaixou a cabeça e seguiu para o quarto.
Um ruído oco, e a porta se fechou
- A culpa é minha... - lamentou Shunrei.
- O que disse? - indagou o Mestre do Santuário afastando a caneca da boca.
Shunrei desabou sobre a outra cadeira e chorou
- Eu sou muito fraca, Shiryu. Nunca faço nada para ajudar - o choro se intensificou. - Agora você e o nosso filho estão brigados e o que eu faço? Nada... Nada!
Shiryu soltou a caneca de chá na mesa e se aproximou de Shunrei.
- Não fale isso, por favor. Você não culpada de nada, minha querida. Nem mesmo o Ryuho é culpado, ele apenas quis ser respeitado e exigiu sua liberdade de expressão que é direto de qualquer pessoa. Eu sou o único errado aqui. Errado em querer fazer do meu filho, uma pessoa que ele nunca quis ser.
A conversa deles se estendeu durante toda a noite. Ryuho havia se trancado no quarto, sentado atrás da porta com os joelhos junto ao peito, para ouvir tudo o que os pais conversava. O cansaço era mais forte e ele não conseguia suportar, além dos ferimentos que latejavam e ardiam agora que o sangue estava frio. Ryuho apoiou a cabeça na madeira e direcionou os olhos para o teto do quarto. Não sabia o que pensar, mas de certa forma sentia-se melhor naquele momento. Finalmente conseguiu dizer ao pai que não queria ser cavaleiro, depois de tantos anos sendo pressionado por essa decisão que nunca foi a sua.
Ryuho pegou no sono ali mesmo, mas quando acordou estava deitado no chão com a cabeça apoiada em um chinelo de palha. Ainda sentia dores no corpo, porém os ferimentos não ardiam mais. O sangue estava seco.
O filho de Shiryu olhou para a janela e tentou intuir que horas seria naquele momento. Ainda estava escuro, não deveria ter dormido mais do que três horas...
- Vou partir amanhã bem cedo. - ouviu a voz do pai ecoar da sala.
- Por favor, Shiryu, espere mais um pouco. - Suplicou Shunrei. - Amanhã vou conversar com o Ryuho e talvez com a cabeça fria ele reconsidere e até aceite a treinar novamente.
- Não. O treinamento de Ryuho acabou, e eu tenho que voltar. Atena precisa de mim no Santuário e os meus amigos também, nosso inimigo está prestes a despertar e não temos tempo a perder. - A voz do pai continuava ríspida e trovejante como na hora do treinamento. Um barulho oco soou na sala. - Obrigado pelo chá querida, agora preciso descansar.
Fez-se silêncio do outro lado da porta, e então a conversa cessou. Ryuho voltou a olhar para a janela e pela primeira vez começou a pensar no que poderia fazer agora que estava livre. A primeira coisa que lhe veio a cabeça foram os estudos, ele sonhava em viajar pelo mundo e conhecer outras florestas e novas montanhas. Também queria ser médico, se imaginou de jaleco e correndo de um lado para o outro com pressa para ajudar as pessoas. Pensou nas pessoas pobre da China, que passavam fome e problemas de saúde, e desejou de todo o coração ser a solução para aquilo tudo.
- Eu vou lutar da minha forma... - as palavras saíram de sua boca como se ela tivesse vontade própria.
A imagem de Ryuho vestindo a armadura de dragão também se materializou em sua mente. Menando a cabeça, ele tentou afastar aquele pensamento. Eu não sou cavaleiro. Disse para si. Mas a imagem ainda estava lá, viva e intensa como se fosse real. Eu não serei cavaleiro... nunca!
Naquele momento uma dor infernal tomou conta do corpo de Ryuho e ele caiu novamente no chão. Seus braços e pernas ardiam como se ele estivesse pegando fogo. Sua cabeça ganhou o peso do mundo e as imagens de sua mente tornaram-se uma confusão de desejos futuros. Ryuho começou a se contorcer, não sabia o que era aquilo, jamais tinha sentido algo tão ruim. E foi então que a dor passou momentaneamente e ele ouviu uma voz feminina que disse:
"Cavaleiros... Eu peço desculpas por estar tomando essa decisão tão repentina, mas eu devo ir ao Monte Everest atrás de Atlas sozinha. Na verdade, eu levarei Shina comigo, pois para resgatarmos a armadura de Serpentário é necessário o poder dela. Mas eu não quero envolvê-los nessa batalha que pode ser a mais perigosa de todas. A terra precisa de vocês, e eu não quero arriscar a segurança desse querido planeta. Por isso, irei até Atlas para impedir que ele desperte de vez e assim venha por em perigo a nossa paz. Perdoe-me meus Lendários e os novos cavaleiros... E também, aqueles jovens que treinaram intensamente e lutaram para alcançar esse objetivo, mas que infelizmente não conseguiram despertar o cosmo... Eu amo todos vocês."
A dor repentina voltou a dominar o corpo de Ryuho. Seu peito era a parte que mais doía, e ele percebeu que o peso de sua cabeça não era nada comparado ao que ele sentia em seu coração. A deusa Atena falou comigo...
Um ruído estrondoso que ecoou da sala, fez Ryuho se levantar mesmo sentindo tanta dor. Quando ele abriu a porta no quarto, deparou-se com seu pai correndo em direção a saída da casa. A expressão no rosto de Shiryu era de desespero e uma fisionomia de medo que Ryuho nunca tinha presenciado nele.
- O que aconteceu pai... De quem era aquela essa voz? É Atena?
Shiryu parou, mas nada respondeu.
- Por favor, pai! Era Atena... foi ela quem falou comigo?
O Mestre do Santuário abriu a porta ainda em silêncio. Deixou que a brisa da noite adentrasse a casa e tomasse o ambiente trazendo um doce aroma de lavanda.
- Pai! O que está acontecendo? Quem é Atlas... E o que é armadura de Serpentário?
Shiryu soltou a porta e virou-se para o filho. Sua expressão era outra, e naquele momento seus olhos cintilavam um sentimento de aversão.
- Volte para o seu quarto, Ryuho. Isso é assunto para os cavaleiros, e você não é um cavaleiro.
Shiryu virou as costas e correu para a escuridão da noite que cobria o céu dos Cinco Picos Antigos. Shunrei saiu em disparada do quarto logo depois, mas já era tarde. Ryuho ficou atônico com os olhos direcionados para a saída da casa, pensando em tudo que tinha falado para o pai naquele dia... Lágrimas surgiram em seus olhos e escorreram por seu rosto, como se todo aquele peso do mundo que sentira minutos atrás estivesse sendo derramado com elas.
- Shiryu... - disse Shunrei antes de desabar em choro no chão da sala.
Ryuho ainda pensava em cada palavra que tinha dito ao pai. Seu rosto expressava explicitamente o sentimento de arrependimento. Ele não saberia explicar o porque estava sentindo aquilo, jamais quis ser um cavaleiro e lutar ao lado dos outros guerreiros, não tinha motivo para chorar... Ou tinha! Atena tocou seu coração mesmo ele recusando com toda as suas forças as oportunidades que o pai lhe dera para despertar o cosmo.
O barulho da chuva que começava a cair pesadamente lá fora se fundiu ao som do lamento de Shunrei que chorava ainda mais. Parecia estar sentindo a mesma dor que Ryuho havia sentido, ou talvez até pior. Shunrei sentia-se mal toda vez que Shiryu partia, e toda vez que ele corria daquela maneira o sentimento de incerteza de que ele não voltaria surgia em seu coração como se fosse um veneno sem antídoto.
Ryuho enxugou as lágrimas com as costas da mão. Correu pela sala e passou como um raio pela porta da casa. Os respingos da chuva caíram sobre sua cabeça, mas ele não se incomodou e continuou correndo. Ele pensou ter ouvido a voz de sua mãe chamando por seu nome, mas não podia voltar... Não queria voltar.
Continuou correndo sem se importar com as dores que sentia nos membros e nos músculos, a pior e mais forte das dores ainda ardia em seu peito. Ryuho dobrou para a direita depois de correr por mais ou menos dois minutos por um caminho de terra. Entrou em uma abertura feita por suas rochas que se encontravam. Estava escuro e chovia muito, mas ele conhecia o caminho, tinha ido naquele lugar por mais vezes do que necessário com seu pai. Nesse instante, se lembrou que certa vez, Shiryu o fez caminhar até a cachoeira de olhos vendados. O pai dizia que se um dia ele perdesse a visão deveria saber como chegar ao único local aonde ele poderia meditar e recuperar suas forças.
A gigantesca cachoeira surgiu na sua frente, as águas silenciosas e claras pareciam cair mais intensamente com a chuva. Ryuho cerrou os punhos e seguiu em direção a rocha na qual subia quando treinava com o pai. Sem pensar, ele investiu um ataque com os punhos fechados em direção a cachoeira. Como sempre, Ryuho foi lançado a metros de distância, chocando-se pesadamente contra as pedras. Levantou-se mais rápido do que de costume e investiu em outros golpes. Caiu novamente, mas se levantou e atacou com mais força as águas que escorriam pela cascata.
- Eu vou conseguir! - Bradou para si, após ter caído pela vigésima vez.
Ryuho cerrou os punhos, mas agora ficou parado de frente para cachoeira de Rozan, tentando se lembrar das palavras de seu pai sobre o conceito do cosmo e o que ele fazia.
O cosmo é a principal fonte de energia dos cavaleiros... Utilizando este poder, é possível destruir os átomos, controlar sua velocidade e até mesmo transmutar materiais. O cosmo pode ser despertado por qualquer humano... se o cosmo for elevado o suficiente, ele explodirá. A explosão do cosmo gera um pequeno Big Bang no interior do indivíduo, expandindo sua aura ao volume máximo e permitindo que ele acesse a essência do cosmo, o sétimo sentido!
- A essência do cosmo... - repetiu Ryuho com convicção. - O sétimo sentido!
Naquele momento uma densa massa verde azulado começou a envolver o corpo do filho de Shiryu. Os olhos dele brilhavam como fogo e seus braços pareciam mais leves e mais fortes.
As roupas de Ryuho rasgaram e foram varridas pelo forte vento que se formou ao seu redor. Seu cosmo ficava ainda mais intenso a cada segundo que passava e aos poucos toda aquela dor que sentia desaparecia.
Perdoe-me meus Lendários e os novos cavaleiros... E também, aqueles jovens que treinaram intensamente e lutaram para alcançar esse objetivo, mas que infelizmente não conseguiram despertar o cosmo...". A voz de Atena tornou a soar dentro do coração de Ryuho e o jovem sentiu-se ainda mais forte.
- Perdoe-me pela demora, Atena! Eu vou despertar o meu poder, e vou ao seu encontro para lutar ao seu lado!
Ryuho saltou em direção a cachoeira e desferiu um golpe nas águas com o punho cerrado. Não houve dor no momento do impacto, nem mesmo o seu corpo sofreu qualquer tipo de reação. Ryuho estava parado no ar, com o punho fixado por dentre a água da cachoeira que caia como estrelas brilhantes. Algo queimou dentro do peito de Ryuho, e ele sentiu-se ainda mais poderoso, e então desferiu um segundo golpe na rocha da montanha. Fez-se silêncio por alguns segundos, e então o filho de Shiryu ouviu um ruído de pedra sendo trincada, e depois outros ruídos semelhantes ecoaram... Até que um conjunto de barulhos da rocha se partindo se intensificou como uma melodia aos ouvidos dele.
- Eu consegui... - Ryuho caiu pesadamente no chão, nu e sem se mexer.
Ryuho viu quando as águas da cachoeira pararam de cair. Ele sorriu, mas não tinha forças para se manter de pé. Novos ruídos de pedras partindo ecoaram em seus ouvidos, mas não havia nada o que fazer...
- Eu cheguei tão perto... - sussurrou para si.
Naquele momento, tudo ficou escuro e Ryuho fechou os olhos esperando para ser consumido pelas tenebrosas águas da cachoeira de Rozan que logo voltariam ao seu sentido normal. Antes de perder o total controle de si, e ficar inconsciente, Ryuho sentiu um solavanco que suspendeu seu corpo. Estava fraco demais para identificar a origem daquilo que sentira, e mesmo que soubesse, não podia fazer nada quanto a isso. Ele esperou, e então desapareceu na escuridão que dominou seus olhos.
Quando abriu os olhos, pensou que estava sonhando. Shiryu estava na sua frente, fitando-o com cuidado e com uma expressão de espanto, mas viu que nos olhos do pai havia uma certa dose de orgulho. Ele viu...
- Pai...Você voltou.
- Não faça esforço. Você ainda está fraco.
Ryuho sorriu e estendeu a mão direita. Tinha três dedos quebrados e o pulso estava fraturado, além dos cortes, sangue e inchaços que adquirira após intensos golpes na rocha.
- Você conseguiu. - disse Shiryu com orgulho.
Ryuho sentiu a mão do pai acariciar o seu rosto, era um toque confortante.
- A cachoeira já voltou ao normal? - quis saber.
- Não. - Shiryu virou-se na direção da cascata e depois devolveu o olhar para o filho. - Ryuho, você não só reverteu o fluxo da água, como também fez com que ela ficasse estagnada por quase três minutos. Sem contar que você dividiu ela em duas, você... Ryuho, você destruiu parte da montanha de Rozan com apenas a força do seu cosmo!
Ryuho sorriu e fechou os olhos, não tinha forças para se manter acordado.
- Não durma agora!
- Eu... Pai... Eu fiz o impossível
Shiryu colocou as duas mãos sobre a face do filho e disse sorrindo:
- Não durma, até ver a sua armadura de dragão que está ali à sua espera.
Ryuho abriu novamente os olhos, e os direcionou para o local aonde seu pai tinha sinalizado. E lá estava ela, radiante como o sol e brilhante como diamante. A armadura que fora usada por Shiryu dezenas de vezes em prol da justiça. Ela é linda. Ryuho não tinha forças para levantar e vesti-la, mas sabia que logo poderia fazer isso, portanto deu um largo sorriso para o pai, e tornou a fechar os olhos.
- Seus inimigos não vão esperar por você. Levante-se!
Ryuho apoiou as duas mãos feridas no chão e se ergueu com o corpo tremulo e pesado como pedra. Suas roupas encontravam-se rasgadas e seus braços tinham finos cortes, como se ele tivesse sido atingindo por agulhas. O filho do Mestre do Santuário com a doce e religiosa Shunrei, nascera há treze anos. Naquela época Shiryu ainda não era o mestre e vivia com sua esposa, em um tempo tranquilo que muitos julgaram ser o tão esperado tempo de paz. Ryuho crescera nas terras dos Cinco Picos Antigos, onde seu pai se tornou o cavaleiro de Dragão. Recebeu ensinamentos de Shiryu e ouviu todas as histórias das muitas batalhas no qual o pai havia enfrentado ao lado de Seiya, Hyoga, Shun e Ikki. Mesmo assim, ele nunca demonstrou grande entusiasmo quando o pai o lembrava que um dia ele também se tornaria um cavaleiro de Atena. Ryuho sentia-se bem na sua terra e não via necessidade de sair dela por nada. Atena não vai sentir minha falta. Disse ele certa vez para o pai. Ela tem muitos cavaleiros, e também, todos os inimigos foram derrotados, não temos o que temer.
As palavras de Ryuho deixaram Shiryu enfurecido, e como repreensão o Lendário guerreiro mandou seu filho ir para casa e lá ficar confinado por dois dias lendo livros sobre mitologia e a importância do Cosmo. Além disso, o fez repensar sobre a questão de proteger Atena. O jovem pouco se interessou pelo assunto, mas leu e refletiu sobre o que o pai tinha dito.
- Controle suas emoções! - bradou Shiryu - para alcançar o Cosmo você deve se manter concentrado e calmo. Se continuar agindo dessa maneira afobada, jamais irá reverter o fluxo da cachoeira!
- Controle suas emoções! - bradou Shiryu - para alcançar o Cosmo você deve se manter concentrado e calmo. Se continuar agindo dessa maneira afobada, jamais irá reverter o fluxo da cachoeira!
Ryuho olhou para o pai e assentiu.
- Agora vá!
Ryuho cerrou os punhos e se pôs em movimento, andou por algum tempo e depois correu em direção as águas silenciosas e claras da cachoeira de Rozan. O golpe foi rebatido pela força da água e o filho de Shiryu foi lançado à metros de distância, chocando-se com uma rocha; na qual já havia batido dezenas de vezes.
- É impossível! - Protestou Ryuho, como se estivesse usando a pouca força que lhe restava para falar.
- Os cavaleiros existem para isso. Eles fazem o impossível, e são capazes de operar milagres! Levante-se!
Ryuho tentou levantar apoiando as mãos no chão, mas o peso do seu corpo ferido o levou novamente para baixo. Sentia os músculos de seus braços e pernas dormentes, e a cabeça doía muito. Seu peito ardia como se ali estivesse um pedaço de carvão em chamas.
- Olhe para mim, Ryuho. - chamou Shiryu com uma voz branda e com o tom autoritário de antes - Infelizmente, você ainda não entendeu o que é o cosmo e nem o que ele significa. Sem esse conhecimento você só vai se machucar. Jamais irá reverter o fluxo da cachoeira desse jeito. Lembre-se de todos os meus ensinamentos e de tudo que lhe falei de Atena e dos meus companheiros.
Ryuho direcionou os olhos para pai, e ouviu as palavras de maneira atenta, mas sua mente estava em outro lugar distante no qual ele jamais tinha ido ou conhecesse. A única certeza que seu coração alimentava era o fato de ele não ser um cavaleiro como o pai.
- Eu lembro e entendo, pai. - mentiu Ryuho, com uma voz falha e cansada.
- Não, não lembra. Portanto vou explicar novamente. - O Mestre do santuário aprumou-se; mantendo as costas eretas. Fechou os olhos, e juntou as mãos próximo das pernas. Shiryu ficou em silêncio por alguns segundos naquela posição de meditação, deixando que o vento refrescante que corria nos Cinco Picos Antigos percorrer todo o seu corpo.
- O cosmo é a principal fonte de energia dos cavaleiros - Disse Shiryu, quebrando o silêncio que tinha imposto a si. - mas é muito mais do que poder de destruição. Cosmo é o conceito filosófico baseados tanto em filosofias orientais quanto ocidentais e é a origem da vida e da matéria do universo. A cosmo-energia dos cavaleiros de Atena, está relacionada com os átomos de qualquer material e seus movimentos. Utilizando este poder, é possível destruir os átomos, controlar sua velocidade e até mesmo transmutar materiais. O cosmo pode ser despertado por qualquer humano, mas dificilmente um adulto leigo no assunto o despertará, pois este geralmente estará preso ao "mundano senso comum", que prejudica a compreensão de milagres. - O Mestre do Santuário fez uma pausa e concentrou seu poder ao redor do corpo. Uma massa esverdeada envolveu Shiryu e se expandiu até sobrepor todo o espaço que estava num raio de dez metros. - Mas, caso um adulto já tenha despertado o seu cosmo, certamente ele terá uma cosmo-energia muito mais poderosa do que ele imagina.
- É impossível! - Protestou Ryuho, como se estivesse usando a pouca força que lhe restava para falar.
- Os cavaleiros existem para isso. Eles fazem o impossível, e são capazes de operar milagres! Levante-se!
Ryuho tentou levantar apoiando as mãos no chão, mas o peso do seu corpo ferido o levou novamente para baixo. Sentia os músculos de seus braços e pernas dormentes, e a cabeça doía muito. Seu peito ardia como se ali estivesse um pedaço de carvão em chamas.
- Olhe para mim, Ryuho. - chamou Shiryu com uma voz branda e com o tom autoritário de antes - Infelizmente, você ainda não entendeu o que é o cosmo e nem o que ele significa. Sem esse conhecimento você só vai se machucar. Jamais irá reverter o fluxo da cachoeira desse jeito. Lembre-se de todos os meus ensinamentos e de tudo que lhe falei de Atena e dos meus companheiros.
Ryuho direcionou os olhos para pai, e ouviu as palavras de maneira atenta, mas sua mente estava em outro lugar distante no qual ele jamais tinha ido ou conhecesse. A única certeza que seu coração alimentava era o fato de ele não ser um cavaleiro como o pai.
- Eu lembro e entendo, pai. - mentiu Ryuho, com uma voz falha e cansada.
- Não, não lembra. Portanto vou explicar novamente. - O Mestre do santuário aprumou-se; mantendo as costas eretas. Fechou os olhos, e juntou as mãos próximo das pernas. Shiryu ficou em silêncio por alguns segundos naquela posição de meditação, deixando que o vento refrescante que corria nos Cinco Picos Antigos percorrer todo o seu corpo.
- O cosmo é a principal fonte de energia dos cavaleiros - Disse Shiryu, quebrando o silêncio que tinha imposto a si. - mas é muito mais do que poder de destruição. Cosmo é o conceito filosófico baseados tanto em filosofias orientais quanto ocidentais e é a origem da vida e da matéria do universo. A cosmo-energia dos cavaleiros de Atena, está relacionada com os átomos de qualquer material e seus movimentos. Utilizando este poder, é possível destruir os átomos, controlar sua velocidade e até mesmo transmutar materiais. O cosmo pode ser despertado por qualquer humano, mas dificilmente um adulto leigo no assunto o despertará, pois este geralmente estará preso ao "mundano senso comum", que prejudica a compreensão de milagres. - O Mestre do Santuário fez uma pausa e concentrou seu poder ao redor do corpo. Uma massa esverdeada envolveu Shiryu e se expandiu até sobrepor todo o espaço que estava num raio de dez metros. - Mas, caso um adulto já tenha despertado o seu cosmo, certamente ele terá uma cosmo-energia muito mais poderosa do que ele imagina.
Ryuho continuou com a atenção voltada para o pai. Aquilo não era nenhuma novidade para ele, sabia o quanto Shiryu era poderoso, e já havia presenciado a demonstração de tal poder umas duas mil vezes em toda a sua vida.
O Mestre do Santuário prosseguiu enquanto permanecia elevando o seu cosmo.
- A origem do poder cósmico é um pequeno universo que existe no interior dos seres vivos, apesar de apenas parte deles poder sentir este universo. Quando o cosmo do indivíduo é elevado, este universo se expande, criando um fenômeno conhecido como "aura." A aura é a manifestação visual da queima do cosmo, que é o estágio intermediário da elevação do mesmo. Durante a queima do cosmo, o universo interior do indivíduo arde, e a aura se expande conforme a temperatura aumenta, se o cosmo for elevado o suficiente, ele explodirá. A explosão do cosmo gera um pequeno Big Bang no interior do indivíduo, expandindo sua aura ao volume máximo e permitindo que ele acesse a essência do cosmo, o sétimo sentido.
Naquele momento Shunrei chegou ao local do treinamento, mas sabia que deveria se manter afastada.
- Apenas acordando o cosmo, uma pessoa pode ganhar habilidades diversas, como telepatia ou intuição. Elevando o cosmo se é possível atingir velocidades subsônicas, quando o indivíduo o queima, pode atingir velocidades ultra-sônicas ou Mach de 100 golpes por segundo. A explosão do cosmo aumenta a velocidade dos golpes para absurdos Mach 800+, atingindo a velocidade da luz em Mach 880.97 você será capaz de alcançar bilhões de golpes por segundo...
- Isso é loucura, pai! - Gritou Ryuho interrompendo Shiryu.
Shunrei arregalou os olhos e estremeceu, ela nunca tinha visto o filho daquela maneira.
- Como é que uma criança de treze anos será capaz de despertar um poder que visa explodi-lo por dentro. - apontou para a cachoeira e prosseguiu. - Além disso, é impossível reverter o fluxo dessas águas.
- Já falei dezenas de vezes que não é! - Bradou Shiryu. E novamente Shunrei estremeceu. - Eu consegui quando ainda era uma criança. Você é meu filho, e tudo que aprendi com meu venerável mestre eu lhe passei. Você é forte e conseguirá, basta querer!
- E se eu não quiser! - Gritou Ryuho como se suas últimas forças estivessem expressas naquelas palavras. - Será que o senhor não entende. Eu não quero ser cavaleiro. Eu quero viver aqui, com a minha mãe e você, pai! Entenda isso, por favor. Eu não pedi para treinar e quem foi que disse que eu devo ser um guerreiro como o senhor foi?
Shunrei colocou as mãos sobre os lábios horrorizada, mas seus olhos não conseguiram esconder todo o espanto que sentia.
As palavras de Ryuho penetraram como uma flecha maligna no peito do Mestre do Santuário. Ele nunca pensou em ouvir aquilo de seu filho. Na verdade, Shiryu recusava-se em acreditar que estava escutando aquilo. Viajara quilômetros para passar os últimos ensinamentos para o filho, e finalmente lhe entregar a sua armadura de dragão, para que Ryuho lutasse ao seu lado pela paz na terra e pela segurança de Atena. Mas todo aquele sonho e desejo havia sido levado pelas águas da cachoeira que desciam claras e silenciosa nos Cinco Picos Antigos.
- Está bem. - Disse Shiryu diminuindo a intensidade do seu cosmo, até que a luz se extinguiu. - Não há mais nada o que dizer e nem lhe ensinar. Vou respeitar sua decisão, Ryuho. Seu treinamento acabou.
Shiryu levantou-se e sem dar mais nenhuma palavra seguiu à passos longos para casa.
- Espere, querido. - Disse Shunrei com sua eterna e serena voz. - O que aconteceu? Diga-me.
O Mestre do Santuário apanhou as mãos da esposa nas suas, acariciou e depois se afastou sem dar qualquer tipo de explicação. Shunrei olhou na direção de Ryuho que tinha os olhos direcionados para o nada, numa direção contrária. Ela percebeu que ele chorava. Talvez estivesse arrependido das palavras que tinha dito ao pai ou esperava um pedido de desculpas dele.
Shunrei pensou em dezenas de coisas que poderia dizer para acalmar os dois. Ele sabia que a vida de uma cavaleiro não era fácil, pois convivera com isso durante toda a sua vida esperando Shiryu durante as noites e dias, ou até mesmo rezando por ele enquanto lutava. Ela também pensou na possibilidade de Ryuho mudar de ideia. O filho estava se sentindo pressionado desde que o pai chegou e não sabia como agir. Sua missão era despertar o cosmo e se tornar um cavaleiro, mas ninguém nunca o perguntou se era isso que ele queria.
O tempo passou, e Shunrei permaneceu em silêncio. Voltou para casa ao lado do filho, mas não disse nada sobre o assunto. Na verdade ela não puxou nenhum tipo de conversa com ele.
Quando chegaram em casa, viram Shiryu sentado numa mesa bebendo um chá. A fumaça branca da bebida esvoaçava da caneca. Ela sorriu ao ver o marido, mas ele desviou o olhar sem expressar qualquer afeto ou demonstração de carinho. Ryuho abaixou a cabeça e seguiu para o quarto.
Um ruído oco, e a porta se fechou
- A culpa é minha... - lamentou Shunrei.
- O que disse? - indagou o Mestre do Santuário afastando a caneca da boca.
Shunrei desabou sobre a outra cadeira e chorou
- Eu sou muito fraca, Shiryu. Nunca faço nada para ajudar - o choro se intensificou. - Agora você e o nosso filho estão brigados e o que eu faço? Nada... Nada!
Shiryu soltou a caneca de chá na mesa e se aproximou de Shunrei.
- Não fale isso, por favor. Você não culpada de nada, minha querida. Nem mesmo o Ryuho é culpado, ele apenas quis ser respeitado e exigiu sua liberdade de expressão que é direto de qualquer pessoa. Eu sou o único errado aqui. Errado em querer fazer do meu filho, uma pessoa que ele nunca quis ser.
A conversa deles se estendeu durante toda a noite. Ryuho havia se trancado no quarto, sentado atrás da porta com os joelhos junto ao peito, para ouvir tudo o que os pais conversava. O cansaço era mais forte e ele não conseguia suportar, além dos ferimentos que latejavam e ardiam agora que o sangue estava frio. Ryuho apoiou a cabeça na madeira e direcionou os olhos para o teto do quarto. Não sabia o que pensar, mas de certa forma sentia-se melhor naquele momento. Finalmente conseguiu dizer ao pai que não queria ser cavaleiro, depois de tantos anos sendo pressionado por essa decisão que nunca foi a sua.
Ryuho pegou no sono ali mesmo, mas quando acordou estava deitado no chão com a cabeça apoiada em um chinelo de palha. Ainda sentia dores no corpo, porém os ferimentos não ardiam mais. O sangue estava seco.
O filho de Shiryu olhou para a janela e tentou intuir que horas seria naquele momento. Ainda estava escuro, não deveria ter dormido mais do que três horas...
- Vou partir amanhã bem cedo. - ouviu a voz do pai ecoar da sala.
- Por favor, Shiryu, espere mais um pouco. - Suplicou Shunrei. - Amanhã vou conversar com o Ryuho e talvez com a cabeça fria ele reconsidere e até aceite a treinar novamente.
- Não. O treinamento de Ryuho acabou, e eu tenho que voltar. Atena precisa de mim no Santuário e os meus amigos também, nosso inimigo está prestes a despertar e não temos tempo a perder. - A voz do pai continuava ríspida e trovejante como na hora do treinamento. Um barulho oco soou na sala. - Obrigado pelo chá querida, agora preciso descansar.
Fez-se silêncio do outro lado da porta, e então a conversa cessou. Ryuho voltou a olhar para a janela e pela primeira vez começou a pensar no que poderia fazer agora que estava livre. A primeira coisa que lhe veio a cabeça foram os estudos, ele sonhava em viajar pelo mundo e conhecer outras florestas e novas montanhas. Também queria ser médico, se imaginou de jaleco e correndo de um lado para o outro com pressa para ajudar as pessoas. Pensou nas pessoas pobre da China, que passavam fome e problemas de saúde, e desejou de todo o coração ser a solução para aquilo tudo.
- Eu vou lutar da minha forma... - as palavras saíram de sua boca como se ela tivesse vontade própria.
A imagem de Ryuho vestindo a armadura de dragão também se materializou em sua mente. Menando a cabeça, ele tentou afastar aquele pensamento. Eu não sou cavaleiro. Disse para si. Mas a imagem ainda estava lá, viva e intensa como se fosse real. Eu não serei cavaleiro... nunca!
Naquele momento uma dor infernal tomou conta do corpo de Ryuho e ele caiu novamente no chão. Seus braços e pernas ardiam como se ele estivesse pegando fogo. Sua cabeça ganhou o peso do mundo e as imagens de sua mente tornaram-se uma confusão de desejos futuros. Ryuho começou a se contorcer, não sabia o que era aquilo, jamais tinha sentido algo tão ruim. E foi então que a dor passou momentaneamente e ele ouviu uma voz feminina que disse:
"Cavaleiros... Eu peço desculpas por estar tomando essa decisão tão repentina, mas eu devo ir ao Monte Everest atrás de Atlas sozinha. Na verdade, eu levarei Shina comigo, pois para resgatarmos a armadura de Serpentário é necessário o poder dela. Mas eu não quero envolvê-los nessa batalha que pode ser a mais perigosa de todas. A terra precisa de vocês, e eu não quero arriscar a segurança desse querido planeta. Por isso, irei até Atlas para impedir que ele desperte de vez e assim venha por em perigo a nossa paz. Perdoe-me meus Lendários e os novos cavaleiros... E também, aqueles jovens que treinaram intensamente e lutaram para alcançar esse objetivo, mas que infelizmente não conseguiram despertar o cosmo... Eu amo todos vocês."
A dor repentina voltou a dominar o corpo de Ryuho. Seu peito era a parte que mais doía, e ele percebeu que o peso de sua cabeça não era nada comparado ao que ele sentia em seu coração. A deusa Atena falou comigo...
Um ruído estrondoso que ecoou da sala, fez Ryuho se levantar mesmo sentindo tanta dor. Quando ele abriu a porta no quarto, deparou-se com seu pai correndo em direção a saída da casa. A expressão no rosto de Shiryu era de desespero e uma fisionomia de medo que Ryuho nunca tinha presenciado nele.
- O que aconteceu pai... De quem era aquela essa voz? É Atena?
Shiryu parou, mas nada respondeu.
- Por favor, pai! Era Atena... foi ela quem falou comigo?
O Mestre do Santuário abriu a porta ainda em silêncio. Deixou que a brisa da noite adentrasse a casa e tomasse o ambiente trazendo um doce aroma de lavanda.
- Pai! O que está acontecendo? Quem é Atlas... E o que é armadura de Serpentário?
Shiryu soltou a porta e virou-se para o filho. Sua expressão era outra, e naquele momento seus olhos cintilavam um sentimento de aversão.
- Volte para o seu quarto, Ryuho. Isso é assunto para os cavaleiros, e você não é um cavaleiro.
Shiryu virou as costas e correu para a escuridão da noite que cobria o céu dos Cinco Picos Antigos. Shunrei saiu em disparada do quarto logo depois, mas já era tarde. Ryuho ficou atônico com os olhos direcionados para a saída da casa, pensando em tudo que tinha falado para o pai naquele dia... Lágrimas surgiram em seus olhos e escorreram por seu rosto, como se todo aquele peso do mundo que sentira minutos atrás estivesse sendo derramado com elas.
- Shiryu... - disse Shunrei antes de desabar em choro no chão da sala.
Ryuho ainda pensava em cada palavra que tinha dito ao pai. Seu rosto expressava explicitamente o sentimento de arrependimento. Ele não saberia explicar o porque estava sentindo aquilo, jamais quis ser um cavaleiro e lutar ao lado dos outros guerreiros, não tinha motivo para chorar... Ou tinha! Atena tocou seu coração mesmo ele recusando com toda as suas forças as oportunidades que o pai lhe dera para despertar o cosmo.
O barulho da chuva que começava a cair pesadamente lá fora se fundiu ao som do lamento de Shunrei que chorava ainda mais. Parecia estar sentindo a mesma dor que Ryuho havia sentido, ou talvez até pior. Shunrei sentia-se mal toda vez que Shiryu partia, e toda vez que ele corria daquela maneira o sentimento de incerteza de que ele não voltaria surgia em seu coração como se fosse um veneno sem antídoto.
Ryuho enxugou as lágrimas com as costas da mão. Correu pela sala e passou como um raio pela porta da casa. Os respingos da chuva caíram sobre sua cabeça, mas ele não se incomodou e continuou correndo. Ele pensou ter ouvido a voz de sua mãe chamando por seu nome, mas não podia voltar... Não queria voltar.
Continuou correndo sem se importar com as dores que sentia nos membros e nos músculos, a pior e mais forte das dores ainda ardia em seu peito. Ryuho dobrou para a direita depois de correr por mais ou menos dois minutos por um caminho de terra. Entrou em uma abertura feita por suas rochas que se encontravam. Estava escuro e chovia muito, mas ele conhecia o caminho, tinha ido naquele lugar por mais vezes do que necessário com seu pai. Nesse instante, se lembrou que certa vez, Shiryu o fez caminhar até a cachoeira de olhos vendados. O pai dizia que se um dia ele perdesse a visão deveria saber como chegar ao único local aonde ele poderia meditar e recuperar suas forças.
A gigantesca cachoeira surgiu na sua frente, as águas silenciosas e claras pareciam cair mais intensamente com a chuva. Ryuho cerrou os punhos e seguiu em direção a rocha na qual subia quando treinava com o pai. Sem pensar, ele investiu um ataque com os punhos fechados em direção a cachoeira. Como sempre, Ryuho foi lançado a metros de distância, chocando-se pesadamente contra as pedras. Levantou-se mais rápido do que de costume e investiu em outros golpes. Caiu novamente, mas se levantou e atacou com mais força as águas que escorriam pela cascata.
- Eu vou conseguir! - Bradou para si, após ter caído pela vigésima vez.
Ryuho cerrou os punhos, mas agora ficou parado de frente para cachoeira de Rozan, tentando se lembrar das palavras de seu pai sobre o conceito do cosmo e o que ele fazia.
O cosmo é a principal fonte de energia dos cavaleiros... Utilizando este poder, é possível destruir os átomos, controlar sua velocidade e até mesmo transmutar materiais. O cosmo pode ser despertado por qualquer humano... se o cosmo for elevado o suficiente, ele explodirá. A explosão do cosmo gera um pequeno Big Bang no interior do indivíduo, expandindo sua aura ao volume máximo e permitindo que ele acesse a essência do cosmo, o sétimo sentido!
- A essência do cosmo... - repetiu Ryuho com convicção. - O sétimo sentido!
Naquele momento uma densa massa verde azulado começou a envolver o corpo do filho de Shiryu. Os olhos dele brilhavam como fogo e seus braços pareciam mais leves e mais fortes.
As roupas de Ryuho rasgaram e foram varridas pelo forte vento que se formou ao seu redor. Seu cosmo ficava ainda mais intenso a cada segundo que passava e aos poucos toda aquela dor que sentia desaparecia.
Perdoe-me meus Lendários e os novos cavaleiros... E também, aqueles jovens que treinaram intensamente e lutaram para alcançar esse objetivo, mas que infelizmente não conseguiram despertar o cosmo...". A voz de Atena tornou a soar dentro do coração de Ryuho e o jovem sentiu-se ainda mais forte.
- Perdoe-me pela demora, Atena! Eu vou despertar o meu poder, e vou ao seu encontro para lutar ao seu lado!
Ryuho saltou em direção a cachoeira e desferiu um golpe nas águas com o punho cerrado. Não houve dor no momento do impacto, nem mesmo o seu corpo sofreu qualquer tipo de reação. Ryuho estava parado no ar, com o punho fixado por dentre a água da cachoeira que caia como estrelas brilhantes. Algo queimou dentro do peito de Ryuho, e ele sentiu-se ainda mais poderoso, e então desferiu um segundo golpe na rocha da montanha. Fez-se silêncio por alguns segundos, e então o filho de Shiryu ouviu um ruído de pedra sendo trincada, e depois outros ruídos semelhantes ecoaram... Até que um conjunto de barulhos da rocha se partindo se intensificou como uma melodia aos ouvidos dele.
- Eu consegui... - Ryuho caiu pesadamente no chão, nu e sem se mexer.
Ryuho viu quando as águas da cachoeira pararam de cair. Ele sorriu, mas não tinha forças para se manter de pé. Novos ruídos de pedras partindo ecoaram em seus ouvidos, mas não havia nada o que fazer...
- Eu cheguei tão perto... - sussurrou para si.
Naquele momento, tudo ficou escuro e Ryuho fechou os olhos esperando para ser consumido pelas tenebrosas águas da cachoeira de Rozan que logo voltariam ao seu sentido normal. Antes de perder o total controle de si, e ficar inconsciente, Ryuho sentiu um solavanco que suspendeu seu corpo. Estava fraco demais para identificar a origem daquilo que sentira, e mesmo que soubesse, não podia fazer nada quanto a isso. Ele esperou, e então desapareceu na escuridão que dominou seus olhos.
Quando abriu os olhos, pensou que estava sonhando. Shiryu estava na sua frente, fitando-o com cuidado e com uma expressão de espanto, mas viu que nos olhos do pai havia uma certa dose de orgulho. Ele viu...
- Pai...Você voltou.
- Não faça esforço. Você ainda está fraco.
Ryuho sorriu e estendeu a mão direita. Tinha três dedos quebrados e o pulso estava fraturado, além dos cortes, sangue e inchaços que adquirira após intensos golpes na rocha.
- Você conseguiu. - disse Shiryu com orgulho.
Ryuho sentiu a mão do pai acariciar o seu rosto, era um toque confortante.
- A cachoeira já voltou ao normal? - quis saber.
- Não. - Shiryu virou-se na direção da cascata e depois devolveu o olhar para o filho. - Ryuho, você não só reverteu o fluxo da água, como também fez com que ela ficasse estagnada por quase três minutos. Sem contar que você dividiu ela em duas, você... Ryuho, você destruiu parte da montanha de Rozan com apenas a força do seu cosmo!
Ryuho sorriu e fechou os olhos, não tinha forças para se manter acordado.
- Não durma agora!
- Eu... Pai... Eu fiz o impossível
Shiryu colocou as duas mãos sobre a face do filho e disse sorrindo:
- Não durma, até ver a sua armadura de dragão que está ali à sua espera.
Ryuho abriu novamente os olhos, e os direcionou para o local aonde seu pai tinha sinalizado. E lá estava ela, radiante como o sol e brilhante como diamante. A armadura que fora usada por Shiryu dezenas de vezes em prol da justiça. Ela é linda. Ryuho não tinha forças para levantar e vesti-la, mas sabia que logo poderia fazer isso, portanto deu um largo sorriso para o pai, e tornou a fechar os olhos.
Escrito por: Yuri Santos.
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